Querido diário,
Como tudo nessa vida tem uma primeira vez, essa é a primeira que me deparo com um cliente tão desagradável, advindo do Clubmodel. O que realmente foi inédito, pois de lá sempre vem clientes muito bons. Pelas conversas eu já desconfiava, mas quis dar uma chance, afinal, não seria a primeira vez que pessoalmente pudesse ser melhor do que nas mensagens, se esse fosse o caso.
Combinamos de eu ir até a sua casa, no Tatuapé. Prédio com portaria, é claro. Por um instante ele sugeriu mudar para o motel Messalina, mas por ser um sábado à noite, perto do horário de início dos pernoites, concordei que fosse na sua casa mesmo, a fim de evitarmos filas.
Assim que cheguei no endereço, achei a estrutura do prédio estranha. Parecia um hotel caído e não prédio residencial. Por dentro era mais esquisito ainda. O apartamento dele ficava no térreo, no final de um corredor extremamente largo e cheio de portas.
Logo que passei pela sua porta, que já estava semiaberta a minha espera, instantaneamente me deu uma vontade enorme de dar meia volta e ir embora. O lugar era um verdadeiro muquifo. Em um único cômodo tinha a cozinha e um quarto, dividido apenas pelas costas de um guarda-roupa velho. Na ponta um banheiro, que felizmente tive a sorte de não precisar conhecer. Eu nunca tinha ido atender num lugar tão feio e bagunçado. O ambiente tinha um cheiro característico forte e aspecto de sujo. Não consegui disfarçar o meu desconforto de estar ali.
Eu estava com sede e ele quase não tinha água para me oferecer. Me deu o restinho que continha no fundo de um filtro de barro, num copo com formato diferente, que quando bebi senti um cheiro ou gosto estranho, não saberia te dizer. Eu até fiz uma pausa, enquanto bebia, para olhar melhor o copo e ele deu uma leve risada, da cara de nojinho que eu devo ter feito.
Ele me achou um pouco séria e perguntou se eu era tímida, mas na verdade eu estava super desconfortável de estar ali. Ele fez questão de destacar que não era sua moradia oficial, mas independente de ser ou não, como alguém se sujeitava a se hospedar num lugar inóspito como aquele? Era desproporcional pensar que ele tinha condições até mesmo de pagar o meu cachê.
Como tínhamos combinado previamente, pedi que me fizesse o pix assim que eu chegasse. Ele concordou e pediu que eu colocasse uma música para nós, me indicando um notebook velho, com o Youtube aberto, se ausentando por um momento. Coloquei para tocar Massive Attack, tentando melhorar aquela experiência, porém, sem o menor sucesso. Achei que ele tivesse ido fazer o pix, mas só depois percebi que tinha ido ao banheiro. Após um bom tempo voltou, sem que eu ouvisse qualquer som de descarga, e sentou-se na cama de solteiro, desarrumada, para entrar no aplicativo do banco.
Ele não estava conseguindo fazer o pix e internamente torci para que não desse certo e eu pudesse ir embora mais rápido. Daí precisou fazer uma parte por dois bancos diferentes, por conta do limite de pix, devido ao horário. Tínhamos combinado 1:30, o equivalente a R$ 1.050,00. Após dez minutos que eu havia chegado, resolvemos essa questão e iniciamos o encontro.
Ele se sentou numa poltrona velha de escritório e sugeriu que eu pegasse uma cadeira para mim também, dizendo: “Senta, vamos trocar uma ideia”. Na verdade, todas as cadeiras estavam ocupadas com coisas em cima, então escolhi uma mais distante, encostada no armário da pia da cozinha, com uma sacola em cima, que parecia lixo reciclado. Ao movimentar a sacola, vi uma baratinha andando na porta desse armário. Senti ainda mais nojo por estar naquele lugar!!
Começamos a conversar, quero dizer, ele falava e eu mais ouvia, não estava com a minha sociabilidade ativada naquele cenário. Tentava imergir no encontro, mas do meu lado não estava fluindo. Comecei a reparar nele, que era o reflexo daquele ambiente. O achei muito feio e não aparentava que tivesse se preparado para me receber. Moreno, sem camisa, de bermuda, descalço e na cabeça usava um quipá verde.
Teve um momento que sentamos mais próximos e olhei o seu rosto bem de perto, a poucos centímetros do meu. Foi assustador! Eu não conseguia me imaginar beijando ele. Seu hálito, tão perto do meu rosto, não tinha um cheiro bom. Ficamos alguns segundos assim e passei a olhar para baixo, não conseguia encará-lo por muito tempo. Como se tudo aquilo já não estivesse ruim o bastante, ainda comecei a sentir um leve cheiro de urina, vindo do meio das suas pernas. Estava ficando cada vez mais insuportável continuar ali.
Daí ele foi até o notebook para me mostrar uma música e assim que se afastou, subitamente me deu vontade de chorar, eu não queria estar naquela situação, mas estava sem jeito de encerrar. Ele deve ter percebido a minha cara de poucos amigos e disse: “Hoje não precisa rolar nada”. Me deu um alívio momentâneo ao ouvir isso, mas, no segundo seguinte, ele me puxou para seus braços, num rápido movimento. “E a parte do não precisar rolar nada?”, pensei.
Ele já estava cheirando meu cangote, se preparando para dar o bote. Evitei olhar para ele, para que não se sentisse motivado a avançar pelo contato visual, mas eu estava chegando no meu limite, caminhava para um momento em que teria que beijá-lo sem escapatória! Até que, meu pai do céu, tive forças para interromper!
– Olha, eu vou te fazer o pix de volta, porque eu não estou confortável.
Num ato de coragem soltei essa frase e na mesma hora ele também me soltou, dizendo “tá bom”. Peguei meu celular, entrei no aplicativo do banco imediatamente, perguntei a sua chave e torci para que meu limite de pix – que eu nem sei qual é – também não me atrapalhasse. Dinheiro devolvido, peguei minha bolsa para ir embora. Ele perguntou se eu não gostaria de chamar o uber antes de sair, mas respondi que chamava lá de fora mesmo. Eu só queria sumir daquele lugar!
Assim que passei pela porta, lágrimas começaram a escorrer dos meus olhos. Não sei se era um choro de alívio, por não ter me violado a fazer algo que eu não queria, com um homem asqueroso, por dinheiro, ou se era um choro de angústia, por ter me colocado numa situação tão desagradável quanto aquela.
Onde eu estava com a cabeça? Pelas conversas do whatsapp eu já desconfiava não ser uma pessoa bacana, pela fachada do prédio desconfiei que poderia ser uma espelunca, por que deixei chegar naquele ponto? Por que não me ouvi? Por que eu estava ali? Ainda tive o prejuízo de ida e volta do Uber, que não foi barato. No retorno peguei um motorista tão simpático e alegre, mas mal consegui responder ao seu cumprimento, de tanto que eu chorava. Que situação de merda!
Cheguei em casa e tomei um belo de um banho. Até lavei meu cabelo – que já estava limpo – , onze horas da noite. Refleti bastante e decidi adotar novas medidas de segurança. Não atendo mais em domicílio em regiões distantes. Não vou mais até a casa de um estranho, sem ver a sua foto previamente, e o principal: Não chegarei ao ponto de agendar um encontro, no menor sinal de estranheza durante a conversa.
Nunca mais quero me colocar em situações como esta!